Murtosa, Aveiro
Procissões e Romarias
A Romaria de São Paio da Torreira é a maior e a mais afamada das romarias da região da Ria de Aveiro e, seguramente, uma das maiores de Portugal. Acontece por volta do 8 de setembro e reúne, na praia da Torreira, no Concelho da Murtosa, milhares de pessoas, vindas um pouco de todo o país, para em clima de festa, celebrarem o santo menino. Por altura da festa, o núcleo urbano da Torreira, onde residem habitualmente cerca de 3500 pessoas, acolhe diariamente mais de 100.000 romeiros.
A festa possui várias singularidades que celebram a relação com a ria, com destaque para a majestosa regata de barcos moliceiros tradicionais à vela, onde é possível apreciar a beleza destas embarcações e a destreza dos homens que as manobram. Imperdíveis são também as corridas de bateiras à vela e de chinchorros, barcos usados pelos pescadores na faina que, por um dia, se transformam em embarcações de renhida competição. As rusgas, os fogos-de-artifício no mar e na ria e a enorme procissão, recheada de referências ao universo da pesca, são outros momentos imperdíveis.
O culto a São Paio está intimamente ligado à ria e as suas dinâmicas. Até à abertura definitiva da barra de Aveiro, em abril de 1808, que veio estabelecer uma ligação permanente entre a ria e o mar, a gente da região sofria as consequências do assoreamento cíclico das ligações temporárias, feitas pela própria natureza. Sem a saída purificadora para o mar, as águas da laguna estagnavam, trazendo a catástrofe das doenças, que dizimavam as populações e afetavam a economia da região.
Era a São Paio, santo advogado das “sezões” (febres) que a gente marinhoa recorria nestes tempos de aflição, uma devoção que foi ganhando tal popularidade que, depressa, o seu culto começou a crescer exponencialmente, alcançando uma dimensão sem paralelo.
Antes dos estabelecimentos das ligações terrestres, a ria era a grande auto-estrada da região, ponto de contato entre os vários territórios ribeirinhos, por onde tudo partia e chegava: o moliço, o junco, o sal, os produtos alimentares, os materiais de construção e, naturalmente, as pessoas.
Ao contrário de outras festas, o afluxo de gente ao São Paio fazia-se, quase exclusivamente, de barco, por ser este o meio mais cómodo e rápido para chegar à Torreira, incipientes que eram as acessibilidades por terra. Moliceiros, Mercantéis e Bateiras, alinhavam-se nas margens da ria, num espetáculo de dimensão e beleza incomparáveis. As regatas e as corridas de hoje lembram, precisamente, essas chegadas de barco.
Como a festa durava vários dias, os barcos eram, também, usados para pernoitar: a vela era arriada do mastro e estendida sobre a embarcação, servindo de cobertura deste alojamento aquático improvisado.
Os romeiros traziam consigo mantimentos, pequena bagagem e instrumentos musicais, que se juntavam à festa. A origem das famosas “rusgas” do São Paio, está precisamente nestes grupos, que se juntavam, atrás dos tocadores, percorrendo o caminho que ia da Ria até ao Mar e vice-versa.